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Jun
2020

Alterações trazidas pela Lei 14.010, de 10 de junho de 2020

Alterações trazidas pela Lei 14.010, de 10 de junho de 2020
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A Lei nº 14.010, de 10 de junho de 2020, dispõe sobre o Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado no período da pandemia do coronavírus (Covid-19). A legislação em questão alterou alguns procedimentos que merecem ser apontados.

Da prescrição e decadência

O art. 3º da lei suspende/impede a contagem dos prazos prescricionais e decadenciais aplicados a pretensões legais que se refiram a relações de Direito Privado, desde a sua entrada em vigor (10 de junho de 2020) até a data de 30 de outubro de 2020.

Sendo assim, o período compreendido entre 10 de junho de 2020 e 30 de outubro de 2020 será desconsiderado para fins de cálculo dos prazos de prescrição e decadência, não havendo prejuízo aos jurisdicionados.

Das pessoas jurídicas de direito privado

No que toca às pessoas jurídicas de direito privado, a Lei nº 14.010/2020 dispõe que as assembleias gerais poderão ser realizadas por meios eletrônicos até a data de 30 de outubro de 2020, independentemente de previsão nos atos constitutivos da pessoa jurídica.

O parágrafo único do artigo 5º da lei prevê que a assembleia virtual deverá ser realizada por ferramenta eletrônica, que assegure a identificação do participante e a segurança do voto, produzindo assim todos os efeitos legais de uma assinatura presencial, cabendo ao administrador indicar o meio pelo qual se dará a assembleia e o voto.

Das relações de consumo

A lei nº 14.010/2020 também dispõe que está suspensa, até 30 de outubro de 2020, a aplicação do artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor nos casos de entrega domiciliar (delivery) de produtos perecíveis ou de consumo imediato e de medicamentos.

O artigo 49 do CDC dispõe que “o consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio”. Logo, durante a duração da pandemia, o fornecedor não será obrigado a trocar produtos de consumo imediato ou medicamentos que tenham sido adquiridos de forma remota, mesmo que a desistência do credor seja formalizada em período inferior a 7 dias.

Da Usucapião

Da mesma forma que os prazos prescricionais e decadenciais foram suspensos, os prazos de aquisição da propriedade imobiliária ou mobiliária, por meio de usucapião, também estão suspensos entre 10 de junho de 2020 e 30 de outubro de 2020.

Assim, para que seja possível a aquisição de propriedade por meio de usucapião, o interessado deve atender ao prazo aplicável à espécie, todavia, no cômputo de tal prazo não será permitido contabilizar o período de 10 de junho de 2020 a 30 de outubro de 2020, não havendo prejuízo, portanto, aos proprietários de imóveis que não possam exercer a defesa de sua propriedade no período definido pela lei.

Dos Condomínio Edilícios

Assim como no caso das pessoas jurídicas de direito privado, as assembleias de condomínios edilícios, aqueles nos quais há partes de uso comum e partes exclusivas a cada proprietário, poderão ser realizadas por meio virtual, no período compreendido entre 10 de junho de 2020 e 30 de outubro de 2020. A manifestação de vontade de cada condômino será equiparada, para todos os efeitos jurídicos, à sua assinatura presencial.

Não sendo possível a realização de assembleia por meio virtual, o mandato de síndico que vencer a partir de 20 de março de 2020 ficará prorrogado até 30 de outubro de 2020, sendo obrigatório ao síndico prestar contas de forma regular acerca de seus atos de administração, sob pena de destituição.

Do regime concorrencial

O artigo 14 da lei analisada trata do regime concorrencial, o qual disciplina a atuação dos sujeitos econômicos no mercado, tendo por objetivo regular a concorrência entre as empresas no mercado e proteger os consumidores.

A Lei nº 14.010/2020 determina a ineficácia do artigo 36, parágrafo 3º, incisos XV e XVII e do artigo 90, inciso IV, da Lei 12.529 de 2011, no período de 20 de março de 2020 até 30 de outubro de 2020 ou enquanto durar o estado de calamidade pública ocasionado pela pandemia.

Referidos artigos assim dispõem:

Art. 36. Constituem infração da ordem econômica, independentemente de culpa, os atos sob qualquer forma manifestados, que tenham por objeto ou possam produzir os seguintes efeitos, ainda que não sejam alcançados:

(...)

§ 3º As seguintes condutas, além de outras, na medida em que configurem hipótese prevista no caput deste artigo e seus incisos, caracterizam infração da ordem econômica:

(...)

XV - vender mercadoria ou prestar serviços injustificadamente abaixo do preço de custo;

(...)

XVII - cessar parcial ou totalmente as atividades da empresa sem justa causa comprovada;  

 

Art. 90. Para os efeitos do art. 88 desta Lei, realiza-se um ato de concentração quando:

(...)

IV - 2 (duas) ou mais empresas celebram contrato associativo, consórcio ou joint venture.

 

Logo, enquanto durar a pandemia, não estão vedadas as práticas de “vender mercadoria ou prestar serviços injustificadamente abaixo do preço de custo” e de “cessar parcial ou totalmente as atividades da empresa sem justa causa comprovada”, bem como a celebração de contrato associativo, consórcio ou joint venture entre duas ou mais empresas.

O parágrafo 1º do art. 14 da lei dispõe que as demais infrações previstas no art. 36 da Lei 12.529 de 2011, que forem praticadas durante o período de vigência da medida emergencial, apesar de não estarem com sua eficácia suspensa, deverão ser analisadas diante das circunstâncias extraordinárias decorrentes da disseminação do Covid-19.

O parágrafo 2º do art. 14, por sua vez, traz importante previsão ao dispor que a suspensão do inciso IV, do artigo 90, da lei 12.529 de 2011 não afasta a possibilidade de posterior análise do ato de concentração ou de apuração de infração à ordem econômica dos acordos que não forem necessários ao combate ou à mitigação das consequências decorrentes da pandemia do coronavírus.

Do Direito de Família e Sucessões

No que se refere o direito de família e sucessões, a legislação analisada determina que a prisão civil por dívida alimentícia, prevista no art. 528, § 3º e seguintes do Código Civil, deverá ser cumprida exclusivamente na modalidade domiciliar, sem prejuízo da exigibilidade das respectivas obrigações.

Desse modo, o indivíduo não pode valer-se da pandemia para deixar de pagar a pensão alimentícia devida, porém, não poderá ser encarcerado nas penitenciárias regulares, devendo ser mantido sob regime de prisão domiciliar até o fim da pandemia ou até a quitação da dívida.

O texto normativo também determina que todas as sucessões abertas a partir de 1º de fevereiro de 2020 terão seu termo inicial automaticamente dilatado para 30 de outubro de 2020, não se aplicando o prazo do artigo 611 do Código de Processo Civil, que determina que o processo de inventário e de partilha deve ser instaurado dentro de 2 meses, a contar da abertura da sucessão.

Ainda, o parágrafo único do artigo 16 da Lei 14.010 de 10 de junho de 2020 determina que o prazo de 12 meses do art. 611 do Código de Processo Civil, para que seja ultimado o processo de inventário e de partilha, caso iniciado antes de 1º de fevereiro de 2020, fica suspenso a partir da entrada em vigor da Lei até 30 de outubro de 2020.

 Da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais

Por fim, a legislação ora em análise estende o prazo para entrada em vigor dos artigos 52, 53 e 54 da Lei 13.709, de 14 de agosto de 2018 (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais), que tratam das sanções administrativas impostas aos agentes de tratamento de dados que violarem as regulamentações previstas na referida norma.

Ressaltamos que a Lei 14.010, de 10 de junho de 2020, prorrogou a entrada em vigor apenas dos artigos que tratam das sanções administrativas, mantendo inalteradas as datas de entrada em vigor das demais disposições da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais.

As sanções administrativas somente passarão a ser aplicadas a partir de 1º de agosto de 2021.

Conclusão

Percebe-se que, apesar de pontuais, as alterações buscam evitar transtornos pessoais e perdas financeiras durante a pandemia, devendo ser observadas em sua totalidade pelos aplicadores do direito.

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